Dirigido por Emma Seligman, Bottoms ou Passivonas no português estreia no auge do cinema de comédia camp, um gênero despretensioso que brinca com o ridículo, mas sem deixar de ter qualidade. O longa escrito e protagonizado por Rachel Sennott (Bodies, Bodies, Bodies), é um exemplo de como criar uma obra à la Mean Girls nos tempos atuais, trazendo representatividade de um modo natural. O filme ainda brilha nos momentos dramáticos, mas por muitas vezes se perde em si próprio e torna cansativa a repetição de piadas.
Bottoms irá contar a história de PJ (Sennott) e Josie (Ayo Edeberi), duas amigas que se auto proclamam “gays, feias e sem talento” e que estão nos anos finais do Ensino Médio, prestes a ir para a universidade. Com paixonites por algumas líderes de torcida, as amigas começam a criar histórias de brigas em que se envolveram para conquistá-las, entretanto, o plano se expande quando elas veem a oportunidade de criar um clube de autodefesa para as meninas do colégio, que estão sendo cada vez mais assediadas. Com o clube concretizado, as amigas tentam se aproximar mais de suas paixonites e a partir disso a trama se desenrola.
E a trama é algo extremamente positivo do longa. As brincadeiras com os estereótipos de filmes de romance adolescente junto com os personagens caricatos, são a principal cartada para manter o telespectador extremamente concentrado. Um exemplo que foi muito bem trabalhado, são os personagens masculinos, que não seguem um padrão do que é considerado masculinidade. Todos são jogadores de futebol, que parecem sempre estar prontos para competir e são demonstrados como pessoas frágeis e sensíveis, mas ainda ácidos e imprevisíveis, podendo comparar as construções dos personagens com Regina George de Meninas Malvadas.
E dando enfoque nas personagens principais, é bem possível notar a sátira que as roteiristas pensaram ao escrevê-las. É clara a referência ao filme Superbad – É Hoje, em que os personagens principais são homens excluídos e tentam por tudo conquistar as meninas mais bonitas do colégio. E o que poderia ser só mais uma repetição da mesma fórmula, torna-se algo muito bem construído, tanto pelo roteiro que eleva a comédia dessas personagens ao ponto do ridículo, quanto a adaptação do tema a uma história com estética queer, algo pouquíssimo visto ainda.
E apesar da belíssima construção do roteiro e dos personagens, o filme torna-se repetitivo de piadas em dado momento. O que poderia ser mais uma grande piada que faria o público chorar de rir, acaba se tornando apenas um momento de desconforto para quem assiste. Muitas dessas são apenas colocadas em momentos errados da trama, em que parecem estar lá só para tirar o aspecto dramático e lembrar o público de que o filme se trata de uma comédia.
Entretanto, o que realmente brilha no filme é sua trilha sonora. Com uma construção perfeita para as cenas em que estão colocadas, a trilha original contou com a composição e produção de Charli XCX, que já possui uma parceria com Rachel Sennott, ao sempre colaborar em suas produções. Com um destaque maior para as faixas BOTTOMS e Yes No Okay, que dão uma certa nostalgia para quem cresceu assistindo filmes adolescentes como Sexta-Feira Maluca e As Apimentadas. Além de outras músicas que foram disponibilizadas, como Total Eclipse of The Heart de Bonnie Tyler e PAIN de King Princess, que parecem ter sido feitas para as cenas em que foram inseridas, especialmente essa segunda.
Em conclusão, o filme não é uma obra de arte, como vem sendo tratado pelo público geral, mas sua identidade própria deixa o resultado muito melhor que a proposta. E ainda é de grande valor ressaltar a importância de uma representatividade queer em filmes assim, para que mais jovens possam se enxergar em histórias bobas de ensino médio. Bottoms é uma obra que possui todos os requisitos para se tornar um clássico e manter-se relevante ao longo de anos.