Por Joyce Clara e Iolanda Lima
Durante os dias 16 a 23 de novembro, o Grupo de Teatro Cidade de Ponta Grossa apresentou a peça A Máquina de Somar, sob direção de Emerson Rechenberg. O espetáculo, no Centro de Cultura, recebeu 35 pessoas por noite, por conta da montagem diferente do espaço cênico, o qual levava o público a vários cômodos.
O texto original do dramaturgo estadunidense é de 1922, porém seus elementos remetem ao momento atual. Trata-se de uma crítica irônica ao modelo de trabalho e à substituição do processo manual para o industrial, relacionando-o com as relações sociais e culturais. Apesar da contemporaneidade ter se desenvolvido em muitos aspectos, percebe-se muita semelhança no que diz respeito às relações de trabalho e comportamentos da sociedade.
A peça começa com uma briga do casal principal, que foram designados ao número 0. Destituídos de qualquer identidade, além de arquétipos satíricos, a típica família de bem do clássico “sonho americano” destila ódio contra o que não se enquadra àquilo que acredita ser os “bons costumes,”, como a vizinha que andava pelada em sua própria casa e supostamente mereceria morrer por isso, tendo sido presa pela contravenção.
O sr. 0, trabalhador exemplar numa instituição burocrática e genérica, sonha com a grandeza, mas se encontra com as mãos ocupadas somando e se vê incapaz de mudar sua vida. 25 anos se passaram no mesmo escritório, com o mesmo uniforme, colega e função. Num lapso de coragem, 0 finalmente encontra em si a coragem para solicitar uma promoção.
Em uma virada irônica do destino, a notícia de uma máquina de somar chega aos ouvidos do chefe do escritório de contabilidade. O velho, corrompido pela ganância e praticidade desumana, despede 0 sem nenhuma cerimônia. Colérico por ter sido substituído após dedicar uma vida aos números, 0 assassina seu chefe com um agulhão de sua escrivaninha.
A família 0 se reúne para um jantar, temperado por mais brigas e indiferença. Convidando os casais das famílias 1, 2 e 3. A divisão é feita por gênero durante as conversas, onde as mulheres falavam sobre roupa e moda e os homens sobre o tempo, até que o sr. 0 é preso na porta de casa e levado ao julgamento. Sendo o público o júri dentro do espaço, o personagem começa a admitir o crime, mas com a controvérsia ética da situação; se ele estava trabalhando há 25 anos na empresa, seria justo o trocar por uma máquina mesmo depois de tanta dedicação? O conflito moral dentro do espetáculo leva à reflexão sobre a mão de obra humana dentro de momentos de modernização, e como a substituição pelas máquinas é a prioridade.
O Sr. 0 é preso e sentenciado à morte, onde semanas antes da execução é exibido em um tipo de museu como um animal selvagem. Em seus últimos momentos, sua esposa o visita e mesmo relembrando das boas memórias acabam se desentendendo. O último ato do espetáculo é o personagem sendo executado em sua jaula com um machado.
Em entrevista, Gustavo Mayer, ator do personagem ‘0’, conta que a peça foi montada e ensaiada em um mês e vinte dias, sendo uma das maiores dificuldades trazer nesse processo rápido a significação do texto, pois para ele, são personagens e texto difíceis. O ator antecipou que a próxima peça deverá ter um enfoque completamente diferente dessa, sendo uma comédia.