Por Cultura Plural
Por Bettina Guarienti
Apesar de o catolicismo ser a crença dominante no Brasil, em Ponta Grossa nota-se o crescimento do número de pessoas que buscam respostas espirituais em crenças e práticas alternativas. No dia 2 de novembro, por exemplo, os cemitérios se enchem de flores, velas e visitantes em homenagem aos entes queridos que partiram.
O Dia de Finados, marcado pela tradição cristã, convida os brasileiros a uma reflexão sobre a morte e o que pode existir além dela. No entanto, essa questão, tão universal quanto misteriosa, é interpretada de maneiras variadas por diferentes religiões e filosofias. De acordo com as crenças religiosas, a morte não é apenas o fim da vida, mas um portal que leva a um novo ciclo, seja ele espiritual, físico ou transcendental.
Para os católicos, a crença central envolve a ressurreição e a vida eterna ao lado de Deus para aqueles que viveram conforme os ensinamentos de Jesus. De acordo com o Bispo Emérito de Ponta Grossa, Sérgio Arthur Braschi, a morte não representa o fim, mas um reencontro com o Criador. “Acreditamos que as almas dos que faleceram continuam entre nós, esperando o momento da ressurreição. A oração é uma forma de nos conectarmos e de pedirmos que eles estejam em paz”. O feriado de Finados é um momento de comunhão e de esperança na vida eterna, que traz conforto aos entes queridos.
Algumas religiões populares apresentam a diversidade de rituais e crenças na cidade. No Budismo, por exemplo, o ciclo de vida e morte é entendido de maneira ainda mais abrangente. A doutrina ensina que todos os seres passam por um ciclo de nascimento, morte e renascimento, conhecido como samsara, até atingirem o nirvana, um estado de iluminação e paz plena.
Susumu Saito, um dos criadores da Associação Brasileira Soka Gakkai Internacional (ABSGI), organização budista, explica que a morte é uma etapa, uma transição para uma nova vida. “Nós renascemos e cada renascimento é uma oportunidade de crescimento e aprendizado. O ciclo só termina quando alcançamos o nirvana, quando nos libertamos das ilusões do ego e do sofrimento”. No budismo, os rituais após a morte incluem meditação e orações silenciosas para ajudar a alma a encontrar serenidade em sua passagem para um novo estágio de existência.
Outra cresnça forte em Ponta Grossa é o Islamismo. No Islamismo, a perspectiva sobre a vida após a morte é bastante diferente, mas igualmente marcada pela esperança. Segundo a crença muçulmana, a vida terrena é uma preparação para a vida eterna, que começa após o julgamento final de Deus. O Xeique da Mesquita Imam Ali, Ali Rahimi, conta que, para os muçulmanos, a morte é uma porta para o descanso, mas também para a prestação de contas. “Acreditamos que Deus julgará nossas ações, recompensando aqueles que seguiram o caminho da retidão com o paraíso. O Dia de Finados é respeitado pelos muçulmanos como uma oportunidade de lembrar a importância das nossas ações e de refletir sobre a brevidade da vida”, destaca o Xeique. As famílias muçulmanas oram por seus mortos, pedindo misericórdia e descanso para suas almas.
No Islã, a visão da vida após a morte é um dos pilares fundamentais da fé, profundamente conectada à ideia de justiça divina e ao conceito de responsabilidade moral dos seres humanos. Essa crença na vida após a morte é central na vida de um muçulmano e está ligada à ideia de um propósito maior, um compromisso de viver em conformidade com os ensinamentos de Allah (Deus), conforme revelados ao profeta Maomé (Muhammad) no Alcorão.
Para os muçulmanos, a crença na vida após a morte também funciona como um guia ético e moral. O entendimento de que haverá um julgamento final incentiva os fiéis a viverem de acordo com os ensinamentos do Alcorão e a seguir o exemplo do Profeta Muhammad, promovendo virtudes como honestidade, compaixão e generosidade.
Ali Rahimi lembra que a certeza de um destino pós-morte não apenas traz consolo para os praticantes da religião, ela tem como função também reger os atos ainda na terra. “Para nós, a vida após a morte é um incentivo para que o fiel conduza uma vida responsável, evitando o pecado e praticando boas ações que beneficiarão não apenas a si, mas também a sociedade ao seu redor”.
Na Umbanda, religião brasileira que mistura elementos africanos, indígenas, cristãos e espíritas, a vida após a morte também é entendida como uma continuidade da jornada espiritual. Para os umbandistas, a morte não é o fim, mas uma passagem para um novo plano, onde o espírito continua seu processo de evolução e aprendizado.
“A morte é uma transição, uma troca de morada”, explica Rosângela de Aguiar, dirigente do terreiro Caboclos da Lei. Segundo ela, quando uma pessoa desencarna, seu espírito é acolhido pelos guias e entidades que auxiliam na passagem para o plano espiritual. “Tudo depende da vibração daquela alma. Se ela viver em harmonia, com amor e caridade, terá um caminho mais tranquilo. Caso contrário, precisará trabalhar para se libertar das energias negativas acumuladas durante a vida”, detalha.
A Umbanda adota muitos princípios do Espiritismo, como a ideia de que a alma continua sua jornada em busca de evolução moral e espiritual. No entanto, a prática umbandista é singular ao incluir a presença de entidades espirituais, como pretos-velhos, caboclos e crianças, que atuam como guias e protetores no plano espiritual.
Apesar das diferenças entre religiões e culturas, há uma convergência significativa: a ideia de que a morte é uma transição, não um fim absoluto. Para muitas crenças, a vida continua de outras formas, seja no plano espiritual, em ciclos de renascimento ou na perpetuação simbólica por meio da memória. Assim, celebrações como o Dia de Finados vão além do luto, tornando-se uma oportunidade para homenagear os que partiram, refletir sobre a existência e celebrar o vínculo eterno entre vivos e mortos.
Essa data, marcada por rituais, orações e gestos de carinho, lembra que a ausência física não apaga os laços de amor e aprendizado. É um momento de resgatar histórias, valorizar os ensinamentos deixados e renovar a certeza de que aqueles que se foram continuam presentes, seja na espiritualidade, nos valores que perpetuaram ou na lembrança viva que se carrega no coração.