Por Cultura Plural
Revelação, fixação, lavagem e secagem são as etapas para transformar um filme fotográfico em algo eterno. Tudo bem que desde o início do século XXI vivemos a popularização das câmeras digitais, contudo a magia de transformar a prata em imagens sempre será algo valioso para os amantes da fotografia. Fotógrafo há 57 anos, ‘Seu Domingos’, 71 anos, conta que o segredo do processo da revelação está na lavagem: “Existe uma teoria entre os fotógrafos que quanto mais tempo lavando a imagem, mais tempo ela duraria”. Mito ou realidade, as fotografias antigas demoravam muito mais tempo para serem reveladas, dependendo da temperatura. Domingos relembra a complexidade de manejar as fotos quando o dia estava frio: “Era precisava usar um aquecedor para que a imagem saísse”.
Padrão fotográfico
Foto para passaporte, identidade, visto, carteira de habilitação, carteira de estudante. Em sua maioria, as fotografias na metade do século XX eram feitas para documentos e quase todas no formato 3×4 – a famosa imagem que torna possível uma pessoa linda ficar feia em um pequeno pedaço de papel. Seu Domingos conta que os fotógrafos preferiam ficar nos estúdios a fotografar na rua, pois “era muito caro e difícil carregar todo o equipamento”.
Devido ao peso das máquinas, os fotógrafos dos anos 1950 e 1960 tiravam fotos estáticas, a sua maioria em casamentos, eventos importantes da cidade ou álbuns de família. Seu Domingos lembra que era preciso seis chapas para fazer as imagens de um matrimônio: “Duas eram do noivo com a noiva, duas apenas da esposa e duas com os pajens”.
Manipulação e desenvolvimento
A evolução da fotografia trouxe avanços para os profissionais da área, que precisaram aprender a manejar desde as placas das antigas máquinas de madeira até o ‘photoshop’ utilizado nas câmeras digitais mais tecnológicas. Falando em manipulação de imagens através de recursos digitais, Seu Domingos lembra que as fotos antigas também eram retocadas e pergunta: “Você já percebeu que as pessoas nas fotografias velhas não tinham rugas?”. Antes de responder, ele abre um sorriso de satisfação ao observar minha feição de surpresa: “As imagens eram remanejadas com um lápis bem fino em cima da ‘gelatina’ da placa. Era preciso ter muito cuidado”.
Mesmo com a ascensão da câmera analógica, Seu Domingos comenta que utilizou, assim como muitos fotógrafos em Ponta Grossa, a chapa ‘gelatinosa’ até o ano de 1995: “As imagens com essa máquina são muito mais bonitas e nítidas, não havia necessidade de usar outra para as fotos posadas”. Como existiam chapas com o tamanho de apenas 18×24, os fotógrafos precisavam usar da criatividade para diminuiu ou aumentar a dimensão de uma fotografia: “No começo nós desenvolvemos duas fotos na chapa, tapando um lado da máquina do papel preto”.
“A gente já ia concentrado, não sentia nada”
A informação é imprescindível para preencher o papel do fotojornalismo. Cartier-Bresson, Dorothea Lange e Robert Capa são os pioneiros da fotografia jornalística, que originava muito mais que uma imagem. Trazia o impacto da realidade. Os fotógrafos brasileiros, em sua maioria, não participaram de guerras e não retrataram tais momentos. Contudo, as imagens dos jornais diários precisavam ser feitas e esses profissionais estavam prontos para ajudar. Seu Domingos comenta que em Ponta Grossa os periódicos não tinham fotógrafos, por isso não eram divulgadas muitas fotos nas páginas dos jornais. Ele ainda lembra que existia uma grande dificuldade para colocar as imagens no papel: “As fotografias eram enviadas para a clicheria de Curitiba. Se eram enviadas de manhã cedo pelo ônibus, apenas no outro dia era possível que a foto estivesse na gazeta”.
De acordo com Domingos, os fotógrafos precisavam fazer imagens de cirurgias, acidentes, partos, corpos no IML: “Eu não sei do que eu não tirei foto. Eu até lembro-me de uma imagem que precisei fazer de uma mulher que levou uma machadada na cabeça. Eu até tirei a fotografia, mas ela não foi publicada”.
Tecnicolor
Com o advento da câmera digital, conta Seu Domingos, qualquer pessoa pode tornar-se fotógrafo: “Hoje em dia não fazem mais fotografia. Colocam tudo na internet e para mim foto é aquela que está no papel”. Apesar da câmera analógica não ser mais tão utilizada, alguns fotógrafos ainda preferem usar o filme, devido à sua qualidade: “As vezes fizemos imagens para documentos para os advogados, para não haver manipulação”. Domingos ainda completa, aos risos: “Imagina se soubessem que as fotos são alteradas desde a época da chapa?”.
No ano de 2012, um livro com a biografia de Seu Domingos foi publicado, a obra é resultado do Concurso Municipal de Biografias “Professor Joselfredo Cercal de Oliveira”, de 2011. O autor é um aluno de Jornalismo da UEPG, Afonso Verner. As outras biografias do livro são de Roque Sponholz, produzida por Ismael de Freitas, jornalista, e de Josefa Schimit, da autoria de Nicoly França, também aluna de Jornalismo da UEPG.
Reportagem de Marina Demartini