Por Juliane Goltz
Por Juliane Goltz
Lo Capitano, o drama italiano do diretor Matteo Garrone – o mesmo que dirigiu Pinocchio (2019), que lhe rendeu várias indicações a prêmios – conta a história da jornada enfrentada por dois primos senegaleses, Seydou (Seydou Sarr) e Moussa (Moustapha Fall), em sua ambição de deixar Dakar, no Senegal, para tentar uma vida melhor na Itália. Isso faz com que os jovens passem por diversos conflitos durante o desenrolar do filme como a dor de deixar sua casa, subornos e até mesmo a escravidão. A narrativa se desenrola a passos rápidos mas sem atropelos e segue de forma fluida como se um imigrante ou refugiado estivesse frente a frente com o telespectador contando sua jornada e o deixando navegar em seu relato. Esse aspecto parece ser intencional, já que Garrone conversou com vários refugiados para o desenvolvimento do longa.
O filme mostra um pouco da cultura e crenças senegalesas. Desde as danças do Sabar, que envolve os batuques do instrumento de mesmo nome e as danças ligeiras e mágicas em roda, e também o ato de fé que envolve pedir permissão dos antepassados em um cemitério para realizar a viagem, podemos perceber que o filme se baseia principalmente em fé e esperança de que o melhor está por vir em um outro continente. As imagens do filme carregam uma estética muito bonita apesar de muitas vezes chocante, dolorosa e fria, como um contraste entre a realidade e a fantasia.
Já a trilha sonora também navega entre emoções, com partes bem ritmadas que fazem os telespectadores querer dançar e cantar junto em alguns momentos do drama, e em outros sua composição eleva o sentimento de tristeza e angústia perante as cenas apresentadas ao público.
O filme conta a história a partir de três idiomas, o wolof falado no Senegal, o francês e o inglês, mas mesmo quando legendado há momentos em que as expressões e entonação vocal dos jovens atores são mais que suficientes para levar ao entendimento do público as impressões que o diretor deseja passar, como uma leveza e esperança de dois jovens que sonham em se tornar músicos e ajudar suas famílias e a tristeza no olhar quando as expectativas são quebradas.
Ao acompanhar o desenvolvimento de Seydou, personagem principal da trama, vemos o amadurecimento a partir de suas vivências ao longo da viagem. Pode-se perceber que ele já não é mais só um menino que almeja uma vida melhor, mas sim um capitão, bondoso e apesar de tudo ainda um sonhador, que está no controle de seu destino e não vai afundar diante de dificuldades encontradas.
Lo Capitano aborda claramente como é difícil a situação dos imigrantes africanos para chegar à Europa, desde atravessar países próximos, e cemitérios a céu aberto, como o deserto do Saara e o Mar Mediterraneo, onde estão os corpos daqueles que não conseguiram chegar ao país de destino. Mas algo que o diretor deixa passar no drama, apesar de ser uma ficção e não um documentário, é a falta de contextualização, uma pessoa não quer sair de seu país por acaso, tem um motivo mais profundo, nesse contexto acaba faltando a responsabilização daqueles que colonizaram os países africanos e deixaram a vida mais complicada para os povos da região, como foi o caso de Senegal, antiga colônia francesa.
Assim, o filme poderia ter deixado um pouco de lado a romantização de que a vida na Europa é bela e maravilhosa, visto que em determinado momento do drama Seydou questiona a um trabalhador, que passa pessoas pela fronteira, se na Itália havia pessoas que moravam na rua.
Apesar de alguns erros, o filme mostra-se bem prestigiado, já que concorreu ao Leão de Ouro no 80º Festival Internacional de Cinema de Veneza, onde levou para casa o Prêmio de melhor direção para o diretor Matteo Garrone e o Prêmio de melhor ator jovem pela atuação de Seydou Sarr. Pode, portanto, ser um forte concorrente na categoria melhor filme internacional no Oscar, concorrendo com os filmes Perfect Days, A Sociedade da Neve, Das Lehrerzimmer e Zona de Interesse.