“É uma questão de entrega. Quando eu estou dançando, eu saio de um estado e só sinto. Eu me entrego à emoção, à música, à dança”. Este foi o relato de Jackson Rodrigues, bailarino da Ooxe – Companhia de Dança Contemporânea que teve seu espetáculo de estreia na última sexta-feira (11). O bailarino compõe o grupo formado por mais cinco pessoas que, apesar de suas trajetórias individuais na dança, exprimiam alegria e ansiedade ao apresentar o espetáculo da Ooxe pela primeira vez.
Chego no teatro faltando uma hora e meia para começar. Na entrada, a exposição de fotos dos bailarinos da companhia era a forma com que Jonas Jorge, diretor da Ooxe, quis recepcionar a sua audiência. “É uma imersão ao espetáculo antes mesmo dele iniciar. Quero continuar fazendo isso em apresentações futuras. Hoje é uma exposição de fotos, no próximo, um vídeo? Quem sabe até uma performance?”
O diretor instiga a ambição que a companhia tem em inovar com seus projetos. “Já dancei e coreografei várias apresentações. Mas esse é o meu projeto de criação própria, ao lado de pessoas que confio. E quero que cresça muito mais, inclusive, estamos pensando em convocar novos bailarinos”, relata Jonas, correndo de um lado para o outro entre as portas do vestiário para conferir se todos estavam prontos.
Entrando nos camarins, a importância dada ao detalhe é confirmada novamente: percebi que os bailarinos cortaram e pintaram os cabelos para a performance. “Eu estou com o cabelo igualzinho ao da minha mãe quando era mais nova, ruiva com franjinha”, é o que a bailarina Bianca Reis diz enquanto se preparava para subir no palco. Além disso, Bianca reconhece a importância dos diferentes estilos no meio da dança, “Somos uma companhia independente, então é crucial que cada um opine e dê ideias durante o processo, e isso reflete no resultado da cena em palco”.
Ao seu lado está Fernanda Jurchaks, última bailarina a compor a atual formação do grupo. “Quando o Jonas me chamou, eu sabia que seria um desafio, porque eu não era do contemporâneo. Está sendo uma oportunidade de aprendizado, inclusive para conseguir separar cada modalidade que aprendi, como o jazz e o balé”.
Fernanda Jurchaks (esquerda) e Bianca Reis (direita) se preparam para o espetáculo “Na pele” | Foto: Lilian Magalhães
Bruna Gardinal e Jardel Rodrigues, ensaiadores do grupo, explicam mais sobre o conceito do espetáculo. “Foi minha primeira experiência produzindo tudo, desde a busca por referências até a produção dos livretos. E também os figurinos, que são resultado de ideias amadurecidas para além de uma roupa nude. Pensamos em recortes e combinações de cores”, afirma Bruna.
Jardel mostra algumas de suas marcas na pele que compõem parte das fotos expostas no livreto e na entrada do teatro. “Eu olho para essa tatuagem e lembro que minha mãe não aprovou de início. Esse machucado foi durante um ensaio que eu errei o rolamento no chão, e com essa marca eu não esqueço que, se eu fizer errado, dói. São marcas importantes nas nossas vidas”. No palco, a dupla se destaca em solos que exigem força e concentração, especialmente no momento em que Jardel encontra um a um dos bailarinos, parados, os encarando, como se fossem marcas das quais ele não pode fugir.
Talvez por uma perspectiva de seguidora da companhia, consigo perceber detalhes que foram contidos no espetáculo com relação à pré-estreia e à aula beneficente, o que de acordo com o grupo será apresentado em uma futura versão com restrição de idade. Ademais, apesar de seus ótimos momentos coreográficos representando ansiedade e prazer, senti falta da história sendo contada através dos rostos, revelando o que esses e outros sentimentos podem dizer sobre nós: o espanto, o luto, a alegria calorosa. Por outro lado, não há dúvidas que existe muita conexão entre bailarinos, ensaiadores e direção criativa do espetáculo produzido em menos de um ano de existência do grupo, especialmente demonstrada em momentos em que a narração dos bailarinos fez parte da coreografia um do outro.
Jardel Rodrigues em seu solo durante a apresentação | Foto: Lilian Magalhães
A fluidez combinada à constante repetição dos passos foi uma escolha diferente do usual e faz sentido na proposta deste projeto da Ooxe. Sendo assim, “Na pele” é um espetáculo que usa passos da dança contemporânea para interpretar marcas que impactam de maneira abrupta, enquanto outras são cíclicas, repetitivas, mas que também podem ser prazerosas. Por fim, a roda de conversa pós-espetáculo – que diga-se de passagem, é uma ótima oportunidade para um grupo que deseja conversar, questionar e apresentar novas ideias ao público ponta-grossense – foi um deleite para a plateia, que estava repleta de outros dançarinos da cidade, e para os bailarinos da Ooxe, que foram respondidos por um mar de aplausos e expectativas altas pelos novos projetos do grupo.