Por Manuela Roque
Por Manuela Roque, Sara Dalzotto, Heloisa Ribas Bida e Quiara Camargo
O primeiro dia da Pré-Parada LGBTQIA + dos Campos Gerais, que acontece em conjunto com o 7º Colóquio Mulher e Sociedade, ocorreu na noite de ontem (28), às 19h. O evento, que aconteceu na mesma data em que se comemora o Dia Mundial do Orgulho LGBTQIA +, teve como temas principais “Como entender a diversidade? Debate sobre equidade e inclusão”, com o doutor em Bioquímica pela UFRN, Giulian César Sá, e “Cenários de Inclusão LGBTQIA+”, com a advogada e coordenadora municipal da Aliança LGBTQIA+ de Ponta Grossa, Thaís Boamorte.
O evento iniciou com uma apresentação do professor Vinícius Biazotti, que prestou uma homenagem às três vítimas de violência contra a comunidade LGBTQIA + na última semana: Ana Paula Campestrini, assassinada pelo ex marido num crime de lesbofobia; Gabriel Garcia, também assassinado com um tiro na cabeça, em que o crime já se qualifica como homicídio por homofobia; e Roberta Silva, uma moradora de rua, negra e travesti que teve 40% do seu corpo queimado vivo.
Em sua fala, Biazotti enfatizou que, somente no ano de 2020, mais de 230 pessoas LGBTQIA+ morreram no Brasil por preconceito e violência: “Nós somos um grupo em completa vulnerabilidade social. E é por isso que estamos aqui hoje, segurando esta bandeira, para a gente poder não somente falar do orgulho em si, mas também para reforçar a nossa luta, porque ela precisa ser todos os dias.” O professor também fez o convite para o público acompanhar a Parada LGBTQIA+ dos Campos Gerais, a ser realizada no próximo domingo (04), a partir das 16h. Mais informações sobre o evento estão disponíveis no Instagram da Parada.
O doutor em Bioquímica Giulian César Sá foi o primeiro painelista da noite. Em sua fala, Giulian apontou como principais pilares para entender a luta da comunidade LGBTQIA+ os conceitos de diversidade (ampliação de experiências, culturas e perspectivas), equidade (compreensão de que todos devem ter a possibilidade de falar, atuar e ser ouvidos de maneira justa, igualitária e respeitosa) e inclusão (possibilitar a participação e aceitação de ideias e características de todas as pessoas). Para o doutor, reconhecer essa diversidade e incluir todas as manifestações feitas pelas pessoas LGBTQIA+ é um primeiro passo para uma sociedade mais igualitária. “Não basta só aceitar essas pessoas, não basta só ouvir o que elas têm a dizer, temos que nos preparar para incluí-las dentro do nosso dia a dia, dentro do nosso contexto, e dentro de todos os setores da sociedade civil”, frisa.
Giulian também trouxe para o debate a noção de lugar de fala na sociedade. “Qual o nosso “lugar” na sociedade? Esse assunto condiz com a minha realidade? Precisamos refletir sobre isso e, quando percebemos, muitas vezes não é nosso lugar de fala em diversos aspectos. Discursos específicos pedem por pessoas específicas, que vivem os problemas na pele, que têm então um lugar de fala. O que devemos fazer então é sentar para entender essas pessoas e reconhecer esse sofrimento sentido por elas”, explica. O painelista ainda citou a importância de cada um conhecer os privilégios dados pela sociedade, os quais geralmente não estão presentes na realidade dos membros da comunidade LGBTQIA+: “Não é sobre ter privilégios. É sobre o que fazer com eles. Saber usá-los e trazê-los de modo útil para a sociedade. E você não precisa abrir mão dos seus privilégios, mas sim usá-los para ajudar os outros a seguir o seu lugar de destino de uma forma mais justa”.
A segunda painelista da noite foi a advogada Thaís Boamorte. Em sua trajetória como profissional atuante nas causas LGBTQIA+, Thaís relata que, mesmo fazendo parte da luta enquanto membra da comunidade, ela entende que, em muitos espaços, sua profissão acaba tendo um peso maior do que as falas proferidas por aqueles que fazem parte dos movimentos de militância: “Uma vez eu ouvi que nós, somente por sermos advogados, acabamos abrindo muito mais portas para falar sobre diversidade do que as próprias militâncias. E isso me doeu muito porque eu posso muito bem tratar de todos os avanços jurídicos da comunidade, mas não posso falar por toda ela. Meu local de fala é enquanto uma mulher bissexual cisgênero, o que não engloba todas as letras da sigla LGBTQIA+”, relata.
A advogada também apresentou todas as conquistas em leis dos movimentos LGBTQIA + na Constituição Brasileira, listando datas marcantes como o ano de 2011, em que foi garantido por lei o casamento civil homoafetivo; em 2015 o direito à adoção por casais do mesmo sexo; em 2018 que é estabelecida a possibilidade do uso do nome social em documentos oficiais pela população transexual, sem precisar da cirurgia de alteração de sexo; e a mais recente de todas que, na visão da advogada, foi a maior conquista da comunidade até então: a criminalização da homotransfobia, considerada por lei como crime inafiançável, imprescritível e hediondo. Para Thaís, quanto mais forem divulgados os avanços jurídicos da comunidade LGBTQIA+, menos vítimas da comunidade serão atingidas pelos discursos preconceituosos e intolerantes, ainda enraizados na sociedade.
O terceiro e último momento do encontro foi de perguntas para os painelistas. Ao ser questionado sobre como a sociedade deve trabalhar a inclusão dentro do próprio grupo LGBTQIA+, Giulian explicou que ela deve acontecer primeiramente dentro da comunidade: “Todas as letras têm um porquê, e as pessoas precisam entender cada uma delas para podermos trabalhar a inclusão. Nenhum grupo da sigla deve sobressair e relação ao outro”.
Já Thaís respondeu um questionamento sobre a legislação acerca da criminalização da homotransfobia. Para a advogada, o problema está na efetivação da lei na sociedade: “Se na hora de fazer o boletim de ocorrência você quiser que o escrivão coloque que é homotransfobia, ele precisa colocar. O que acontece é uma falta de informação e conhecimento dos profissionais, que acabam registrando no boletim somente como crime de injúria, o que prejudica no processo de criminalização do ato”. Thaís ainda relata que a Aliança LGBTQIA+ de Ponta Grossa está realizando atualmente um trabalho de conscientização destes profissionais para melhor atender a população LGBTQIA+ em situações criminosas.
O 7° Colóquio Mulheres e Sociedade é uma promoção do Grupo de Pesquisa Jornalismo e Gênero do Mestrado em Jornalismo e pelo projeto de extensão Elos – Jornalismo, Direitos Humanos e Formação Cidadã da Universidade Estadual de Ponta Grossa, em parceria com o Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade de Brasília e parceria da Parada LGBTQIA+ dos Campos Gerais. Hoje (29), o segundo dia da Pré-Parada LGBTQIA + dos Campos Gerais recebe como convidado Rodrigo Moretti, no painel “Políticas Públicas de Saúde LGBTQIA+”. O encontro ocorre às 19h e será transmitido pela página do Facebook do Projeto de Extensão ELOS. Para conferir a programação completa do Colóquio, acesse o site do evento.