Por Leonardo Camargo
Por Mariele Morski
É costume da dona de casa Maria Seniuk levar os alimentos para benzer na Igreja Ucraniana Transfiguração do Nosso Senhor, que foi construída em meados de 1952. “É muito importante nós, descendentes, prosseguir com antigos costumes. É a nossa cultura, então a gente vive e tenta passar para os filhos e netos’’, relata Maria.
Em um texto, publicado por Laércio Sikorski na página do programa Ucraíno Brasileiro de Ponta Grossa, ele diz que na primeira etapa de imigração, a Igreja desempenhou um papel fundamental para que os imigrantes se sentissem mais ‘’em casa’’. A Igreja Transfiguração do Nosso Senhor, localizada no bairro da Nova Rússia, era simples, toda feita de madeira. No ano de 1978 foi feita toda em alvenaria e nos moldes bizantinos ucranianos católicos.
É perceptível andar pela cidade e notar os traços de ‘polacos e ucraínos’ em parte da população. Os ucranianos chegaram ao Paraná entre 1895 e 1897. Mais de 20 mil imigrantes vieram e fizeram suas colônias em Prudentópolis e Mallet. Depois disso, outras cidades também começaram a recebê-los.
Em Ponta Grossa, as comidas típicas de origem ucraniana são cultivadas como parte da cultura desse povo. A chefe de cozinha Maria Esdespki é descendente de ucranianos e, semanalmente, faz algumas das especiarias eslavas em casa: “Continuo fazendo essas comidas porque lembro da minha infância, dos meus avós. Hoje ensino para minhas filhas, é uma maneira de não deixar a cultura morrer”, confirma.
Maria acorda aos sábados e decide na hora o que vai preparar. Às vezes faz pierogue (ou perohe – são pastéis de massa de macarrão, que são cozidas ou fritas, tradicionalmente recheados com batata, chucrute, carne moída ou queijo), no frio a sopa chamada de Borscht, onde os principais ingredientes são: a beterraba, cenoura, batata, cebola, repolho pepino, tomate, vinagre, cogumelo e carne (geralmente de porco), Kapuska (uma sopa feita de repolho azedo com trigo queimado), Holopti (espécie de charuto com recheio de quirera cozida com caldo de feijão, enrolado na couve) e também uma das sobremesas mais conhecidas, o Kutiá (grãos de trigo cozidos, adoçados com mel. Hoje em dia coloca-se também leite condensado e passas e é servido na ceia de Natal).
Cores da Páscoa
Ovos de galinha, avestruz, ganso e até de codorna tem usos diferentes, e coloridos, na cultura ucraniana. Aqui no Brasil ,fazem parte de inúmeras receitas, mas quem é descendente de ucraniano sabe muito bem para que servem.
As Pêssankas são nada mais que ovos pintados à mão. Coloridos e com diversas formas e traços, derivam do verbo pysaty (escrever) e simboliza a vida, a saúde e a prosperidade. São entregues à família e amigos falando no dia da Páscoa “Hréstos Voskrés” (Cristo ressuscitou) e “Voístenu Voskrés” (Em verdade ressuscitou).
Não se sabe bem ao certo quando essa tradição surgiu, mas os mais antigos, contam que o povoado da Ucrânia acreditava que quando os pássaros faziam ninhos nas casas, eles traziam vida, calor e a colheita vingava. Sendo assim, virou um símbolo só de coisas boas.
Em Ponta Grossa, a esteticista Rúbia Kabaz é conhecida por produzir essa arte. Minuciosamente, conta que o primeiro passo é limpar o ovo e retirar a gema e a clara com uma seringa, já que se ficar dentro da casca e um dia cair, o cheiro não será muito agradável. Após isso, os traços começam a ser feitos. Ela usa uma caneta com bico de pena para desenhar. Peixes, galinhas, flores, árvores, trigos, cruz, ondas, sol: esses são os desenhos mais comuns. Depois, passa-se a cera nos lugares onde não serão pintados, ou seja, onde ficará branco, da cor natural do ovo. Aí é mergulhado na tinta, retirado e mais cera é passada, assim por diante, cada cor é uma nova etapa. A última cor a ser mergulhada é na preta. Sim, o ovo vai sair preto.
E em questão de mágica, o fogo da vela derrete toda aquela cera e ‘tcharan’, o desenho é revelado! Depois é envernizado e colocado em um suporte para que pare em pé. É um processo que leva quase o dia todo. Além disso, cada cor possui um significado, mas as mais usadas são as cores quentes (vermelho, alaranjado e amarelo). Rúbia teve o primeiro contato com a pintura em ovos com a avó materna, que era descendente de polonês. “Não sou descendente de ucranianos, mas eu acho tão bonito, é algo que está se perdendo”, revela. Mas só em 1995 fez um curso para aprender técnicas mais elaboradas.
Também conta o quanto alivia o estresse pintar: “Me desligo totalmente quando estou pintando, é uma terapia”. A esteticista recebe encomendas o ano todo, os ovos viram desde presente de casamento e até de aniversário. Recentemente, fez quatro com o escudo do time de Ponta Grossa, o Operário Ferroviário (OFEC). Tudo depende da criatividade de cada um. Os preços variam de R$25 e R$30.
Outra curiosidade sobre as Pêssankas é que elas são bastante vistas nos sábados de aleluia (sábado antes do domingo de Páscoa) nos benzimentos das cestas ou benzimentos da Pascha, realizados nas Igrejas Ucranianas. Esse nome (Pascha – lê se: Paska) vem de um pão que é preparado para se comer no dia da Páscoa. Ele é branco, salgado e enfeitado.
Dentro dessa cesta, é possível ainda encontrar a Babka, que é o pão doce. A beterraba simboliza a morte de Jesus pelos nossos pecados. O Krin é uma raiz forte que simboliza o sofrimento que o pecado causa na vida das pessoas. São colocados também velas, linguiças, ovos, requeijão e, nos dias atuais, tudo o que se come no café da manhã (manteiga, leite, açúcar, biscoitos…). Após a cesta ter sido benzida, os alimentos estão prontos para o consumo no dia seguinte, onde toda família se reúne.