Por Julia Almeida
A história, contada e vivida por Bressan, é uma caminhada pelo começo do fim de um relacionamento. Gabriel Borges, o diretor pontagrossense, cria uma narrativa lúdica e sensorial para contar uma história de amor. Com elementos de distorção de imagem, acompanhamos a construção de um conceito que brinca com a metalinguagem e o fato de ser um filme sobre alguém que está fazendo um filme. O curta, ganhador da Mostra Competitiva Paranaense, no 23° festival Kinoarte de Cinema, transfigura o amor, a arte e a saudade em línguas e, com elas, escreve uma bela história contemporânea e sensível. Eu te amo, Bressan é uma experimentação da realidade.
O curta pontagrossense é repleto de elementos que enriquecem o produto final, que combinados ao roteiro (para mim, o melhor elemento da obra) transformam algo simples, como um término, em algo brutal e doloroso, porém muito sensível. Borges cria um equilíbrio notável ao combinar metáforas e literalidades, mostrando para quem assiste como é transformar a realidade em arte. Combinando o lúdico com o real, encontramos um belo trabalho no uso de cores, planos e recursos simples, mas que transformam a experiência (como o uso do projetor, em uma das últimas cenas do curta).
Apesar de o principal objetivo do roteiro ser deixar claro o fato de que tudo não passa da produção de um filme, isso acaba deixando de lado aquilo que motivou a história. Essa ânsia de informar o espectador sobre o conceito da obra, deixa escondido o lado mais bonito da produção: a memória real por trás dela. Em determinado trecho, Bressan fala: “contar uma história é mascarar a realidade”, e o curta usa desse conceito para passar uma mensagem. Como se deixasse claro que aquela não é a verdade, nos dizendo, empiricamente: “isso é o que eu gostaria de ter feito, mas não foi o que eu fiz”. Ainda no mesmo trecho, ele diz: “a gente tenta encontrar uma maneira de eternizar as coisas”. E de algum jeito isso ressoa, para mim, não como uma forma de eternizar aquela história, mas como uma forma de eternizar aquele sentimento.
O gesto de revisitar e homenagear a sétima arte, fazendo referências a aspectos que qualquer fã de cinema reconheceria, além da montagem como forma de pensamento e o uso experimental da linguagem cinematográfica, aparece como uma inspiração às produções de Jean-Luc Godard. O diretor franco-suíço aborda o cinema de forma fragmentada, ensaística e crítica, frequentemente incorporando imagens de arquivo, citações e referências metalinguísticas. Em Eu te amo, Bressan, a montagem é central: não apenas como técnica narrativa, mas como discurso. Borges constrói sentido na justaposição de imagens e sons, usando a montagem para gerar pensamento, um princípio essencial da estética godardiana. Tanto Godard quanto Borges, não apenas fazem cinema: pensam o cinema dentro do próprio filme.
Ao acompanhar as mágoas de Bressan, sentimos quase fisicamente a sua saudade. E é como se aos poucos, junto dele, reconheçamos sua culpa no fim. Vemos o seu erro, seu medo e seu egoísmo. Não como uma coisa ruim, mas como algo que transfigura o personagem em alguém que, mais do que tudo, sente, com intensidade, mas incerteza. Borges não consegue só definir o que é amar (ou deixar de amar), como também o que é saudade e o que é transformar tudo isso em arte. Bressan se define como amante, como artista, mas principalmente como alguém que sente falta. O curta, de Gabriel Borges, é uma carta para a saudade. Primeiramente, em italiano, porque é a realidade de um artista, transfigurada em arte. Em francês, porque é uma história sobre o amor. E muito mais em português, porque tudo que sobrou foi saudade.
Conheça o autor
Gabriel Borges é montador, curador e diretor de cinema. Mestre em Cinema e Artes do Vídeo pela Universidade Estadual do Paraná. Possui experiência na realização de festivais de cinema e na produção de filmes de ficção e documentários. Atuou como diretor em obras como E no rumo do meu sangue (selecionado para a 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes, a 15ª CineOP e o 9º Olhar de Cinema) e Eu te amo, Bressan (selecionado para a 24ª Mostra de Cinema de Tiradentes).
Como montador, trabalhou em curtas e longas-metragens, entre eles Desvirtude (dirigido por Gautier Lee e vencedor do prêmio de Melhor Montagem de Curtas Gaúchos no Festival de Gramado 2021), Quarentena (dirigido por Adriel Nizer e Nando Sturmer, selecionado para a 25ª Mostra de Cinema de Tiradentes) e Dublê de Namorado (longa dirigido por Christopher Faust, atualmente em fase de finalização).
Além de atuar também na organização e curadoria de mostras e festivais de cinema, como Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba, o Metrô – Festival do Cinema Universitário Brasileiro, o Griô – Festival do Cinema Negro Brasileiro e o Festival de Finos Filmes, é conselheiro da região Sul da APAN – Associação de Profissionais do Audiovisual Negro, membro do Coletivo Inajá em Ponta Grossa e um dos curadores do Cineclube São Bernardo, cineclube de cinema brasileiro baseado em Curitiba.
★ Assista o curta: Eu te amo, Bressan