Por Adriane Hess e Matheus Dias
Antes de conversar com Ruivo, como é conhecido entre seus amigos (e como define a si próprio em seu perfil do Facebook), trocamos algumas ideias com amigas que o esperavam para uma roda de conversas na sorveteria, em uma noite de domingo. Uma de suas amigas o definiu como um rapaz tímido, mas com grande domínio das palavras, e que não as poupará para se expressar. Disse ainda que Kluber era um menino “canhoto de letra bonita”.
Chega João Davi Kluber a sorveteria. João é alto, magro, ostenta um sorriso tímido e cabelos compridos e avermelhados. A princípio, sua voz suave apenas respondia pontualmente as primeiras questões da reportagem, seguidas de breves risos sem-graça. Aos poucos, o Ruivo foi se soltando. Portanto, uma das teses de sua amiga, a da timidez e da eloquência, eram verdadeiras.
Mas ainda restava saber se o jovem pianista tinha mesmo uma letra bonita, apesar de canhoto, partindo do pressuposto de sua amiga, a qual afirma que boa parte dos canhotos que conhece por aí tem uma letra rápida, desleixada e imprecisa. Pedimos que João Davi escrevesse uma frase qualquer no nosso bloco de notas.
Um jovem americano que não gosta de futebol
O jovem músico, nascido na cidade de Orange, Califórnia, EUA, viveu seus primeiros três anos de vida nos Estados Unidos. Depois veio para Ponta Grossa, onde viveu até 2014 e “se criou”, como dizem os mais antigos. Após isso, voltou em duas ocasiões para a América do Norte, a última delas no ano passado, para visitar a avó materna antes que ela falecesse. Ruivo não quis revelar porque a família decidiu se mudar para o Brasil, e respeitamos isso. Aliás, Kluber respondeu a quase todas as nossas perguntas, assim como também não se constrangia em dizer não para temas que não queria abordar, ou ainda:
– Isso você não coloca no texto, por favor.
Aos 17 anos, nascido em 18 de setembro de 1997, ganhou seu primeiro teclado quando tinha sete anos. Uma tia deu para ele e sua irmã gêmea um teclado da marca Radio Shack. Após isso, por intermédio de uma amiga da mãe que dava aulas de música, João e sua irmã começaram a estudar música. Após isso, Ruivo seguiu seus estudos musicais no Conservatório Maestro Paulino, em Ponta Grossa, onde foi também estagiário. No ano de 2015, Kluber entrou na Escola de Música e Belas Artes do Paraná, onde cursa Bacharelado em Piano. O pianista revela que tem intenção de seguir carreira nas notas musicais, como professor ou outra coisa. Não tem certeza se tem vontade de regressar aos Estados Unidos e apesar de ter cidadania estadunidense, se diz um “americano não-fluente”.
– Volto para uma pós, talvez
Agora, Kluber estuda e mora na capital do Paraná. Deixou em Ponta Grossa a mãe, a irmã e os amigos para viver em uma casa de estudantes mantida pela Igreja Luterana, em Curitiba. Nessa habitação, João divide quarto com mais um menino. Não se queixa, afinal, passa boa parte de seu tempo na faculdade, estudando teorias e prática de piano.
Ruivo se descreve como um garoto sedentário, e particularmente não é fã de futebol. Mas um fato chama atenção em seu Facebook: A única fanpage relacionada a esportes que segue é a do jogador brasileiro David Luiz. Tivemos de perguntar se é fã das habilidades futebolísticas do atleta, ou de suas madeixas. Ruivo responde rindo que é mais pela semelhança entre seus cabelos, e que provavelmente seguiu a fanpage do jogador sem prestar muita atenção.
João acredita que as artes dialogam e que, por isso, qualquer indivíduo que queira se envolver com arte deve se interessar e se informar por todo tipo de manifestação artística. E joão põe sua tese em prática. Gosta de filmes, de fotos, de música, de livros. Mas seu gosto por filmes e fotos foge ao mainstream. Ele mesmo reconhece que não é grande fã de produtos culturais massivos de industriais. Enxerga nesses produtos superficialidade e falta de valor artístico. Reconhece também que consome esses produtos, às vezes, mas que prefere a profundidade de outras manifestações que fogem à grande mídia.
Chegar à essência das coisas
Desde muito pequeno Ruivo gosta de ler. Lia de tudo, qualquer coisa o atraía, chamava a atenção, e o deixava inquieto por aprender mais. Em sua infância, foi um garoto de poucos amigos. Era um daqueles vistos com estranheza pelos coleguinhas mais populares da turma. Mas nos últimos anos, garante que tem lidado de forma diferente com o mundo, mais interativo. E sem dúvida, as duas apresentações no Festival Universitário da Canção de Ponta Grossa lhe trouxeram algum reconhecimento.
Sua inquietação por conhecer e aprender nunca o deixou ao longo da vida, seja na música, seja na escola, em noções políticas e opiniões pessoais. Politicamente, prefere se ver como um homem de centro-esquerda. Abomina a superficialidade na educação, em políticas públicas e na música consumida pelo público. Enquanto conversávamos, por poucas vezes a voz de Kluber se exaltou. Mas quando o fez, era para refutar a superficialidade ou para enfatizar a busca pela essência dos temas que discutíamos.
Ele acredita que as manifestações artísticas consumidas e produzidas pelos artistas são comerciais e de pouca qualidade. Para João Davi, esse é um cenário negativo, e sua solução é quase utópica: Aprimorar a educação do público. Mas não uma educação que ensine em que ano tal presidente entrou e saiu do poder, ou que tipo de célula tem uma árvore, e, sim, uma educação que situe o cidadão no sistema político no qual ele está inserido.
Diferentemente de muitos dos músicos que acabam se destacando em cenas artísticas, João Davi Kluber sempre levou consigo os preceitos teóricos da música – leu muito, treinou muito, tocou muito. Mas quando o assunto é composição, o músico se apoia em outros suportes.
Ruivo relata que a primeira composição que fez foi uma canção em inglês para uma pequena paixãozinha infantil, em 2010 ou 2011, aqui a memória falha. Depois disso, passou a compor poesias e outras canções. Ele conta que sente uma forte ligação com a natureza, e estar só em um ambiente calmo e natural o inspira para realizar composições profundas e sensíveis. Da mesma forma, “a loucura das cidades” também o estimula. Mas em um sentido negativo, já que traz à tona sua parte crítica.
FUC e outras coisas mais
– O que eu escrevo?
A regra era escrever absolutamente qualquer coisa. Ruivo, então, pegou a caneta azul com sua mão esquerda e deixou em nosso bloco:
– A vida é tão bela…?.
Não poderíamos deixar o Festival Universitário da Canção de lado. Questionado se há a intenção de participar de mais festivais, a resposta é afirmativa. Gostou da experiência do FUC. Para ele, foi proveitoso conhecer músicos de todo o país, suas canções, inspirações e características. Ele acredita que o clima dos festivais e a troca de experiências proporcionadas por eles acrescentam muito na vida de um músico. Ele uer mais FUC’s e mais festivais.
Apesar do clima bom trazido por festivais de canção, Kluber acredita que o FUC tem também problemas. Para ele, o evento é mal divulgado e peca em organização. Conta que ficou surpreso (no sentido negativo) ao entrar no Cine Teatro Ópera na edição de 2015, e ver o auditório principal do cinema quase vazio. João também se entristece com a participação de músicos em festivais com apenas interesses comerciais. A arte, para Ruivo, é paixão, entrega e trabalho.
Após conversar por aproximadamente uma hora, liberamos Kluber. Da época da entrevista, faltavam cerca de duas semanas para o 18º aniversário de João Davi Kluber.
– E aí, Ruivo, vai ter festa?
– Hum, festa? Acho que não.
– E vai ter porre?
– Porre? Acho que não também.
– E música?
– Música vai ter, e bastante!