Por Fernanda Penteado e Karin Del Nóbile
Foi assistindo ao pai e ao irmão mais velho que, aos cinco anos de idade, Rickson Thai Zenidim descobriu o que queria fazer para o resto de sua vida. A academia é parte do quintal da casa e os programas de artes marciais, a diversão dos finais de semana. Em 2004, ano em que o garoto começou nos tatames, o cenário do MMA (Artes Marciais Livre) no Brasil era diferente do atual, a mídia não abordava o esporte que se popularizou de fato, em meados de 2012, com o atleta Anderson Silva e o Ultimate Fight Championship (UFC).
A família do atleta está envolvida com o MMA desde a década de 1980, quando Paulão, pai e treinador do garoto, participava do famoso “Vale Tudo”. O início da carreira de Rickson, como a do seu do pai, começou naturalmente, conforme conta seu irmão, Ranieri.
– O Rick chegava nos treinos brincando, todo mundo acabava a luta cansado e ele queria sempre mais.
Os treinos passaram de diversão a trabalho, quando Rickson, aos 14 anos de idade, se tornou o lutador profissional de MMA mais jovem do mundo. Assim, as brincadeiras no tatame no contra turno deram espaço para um treino que mistura uma sequência de corridas, natação e luta.
Clã Zenidim
A ligação entre a carreira de Rickson e a família é forte. O atleta, segundo filho do ‘Clã Zenidim’, nome pelo qual a família é conhecida nos eventos em que participa ou organiza, nasceu em Ponta Grossa no dia 17 de fevereiro de 1999 e, assim como os outros três irmãos, seguiu os ensinamentos do pai.
– Eu criei e crio eles com MMA, então é uma satisfação ver eles junto comigo!
Paulão casou-se com Sandra, mãe de Rickson, em cima de um tatame, no meio de um evento de MMA, em setembro de 2007. Sandra também treina, assim como Ranieri, Riran e Raikon, os três irmãos do ‘Rei’.
Aos 16 anos, o garoto é tímido e muito religioso. Caseiro, o maior hobby é ficar em casa tocando violão, assistindo o Canal Combate – que exibe as reapresentações e, também, as lutas patrocinadas pelo UFC e outros promotores de eventos de MMA –, conversando e jogando vídeo game com os irmãos.
O nome dos irmãos também é uma forma de união, conta Paulão. Ele e a esposa decidiram escolher nomes, já no nascimento do primeiro filho – Ranieri – que estivessem entre as letras ‘P’ e ‘S’, as iniciais do casal. Como não encontraram nenhum nome com ‘Q’, passaram a pesquisar com a letra ‘R’, e foi assim que decidiram o nome do primeiro filho, Ranieri. E a lógica foi seguida também para os outros três filhos: Rickson Thai, Riran e Raykon.
– O nome dos garotos é com ‘R’ para eles ficarem sempre protegidos e em família, entre eu e a Sandra.
Rickson Thai é, também, uma homenagem ao Muay Thai. Na época em que ele nasceu, a sobrevivência e sustento da família vinha do esporte.
O início de tudo
Aos sete anos, Rickson já participava de lutas amadoras, que eram adaptadas para crianças. Desde pequeno já estava na rotina da academia brincando e vendo o pai treinar. Em alguns períodos estava jogando futebol, em outros tocando violão, mas sempre passando a maior parte do tempo no tatame, e assim a brincadeira foi se tornando séria, e a vontade de ser lutador maior.
Aos 13 anos, o ponta-grossense começou de fato no mundo das lutas. Sua primeira profissional já foi com um adversário mais velho e desde então, nas seis lutas em que participou a situação foi a mesma.
– Chegou uma hora que ninguém da minha idade queria lutar comigo no amador. Aí fui para outra categoria, para continuar crescendo!
Sua luta de estreia foi aos 14 anos, no evento PF-Paulão Fight 2013, onde conquistou sua primeira vitória. A luta foi contra Shamu Ramos, e foi a única que ganhou por decisão, unânime, dos juízes. Nos próximos combates a vitória viria por finalização. Rickson participou, de mais duas edições do Paulão Fight, de duas edições do CPG MMA e de uma do PF- Palmeira Fight.
Hoje, entre os lutadores profissionais mais novos do mundo, Rickson se prepara para uma luta no Paraguai, em novembro. Os treinos intensificam a cada luta, o foco da família está na carreira do garoto e de Ranieri, três anos mais velho.
– A gente treina pensando na próxima luta, seja ela daqui um mês ou uma semana, conta o pai e treinador dos garotos.
Além dos treinos preparatórios, a alimentação deve ser mais regrada perto da luta, o sal é retirado da dieta e a ingestão de água reduzida. Tudo isso é controlado com disciplina para chegar no dia da pesagem no peso ideal para poder lutar. A atual categoria de Rickson é 58 kg, e, para as próximas lutas, ele pretende lutar na de 61kg.
O Rei
Apesar de ser chamado de ‘The King’ (O Rei) ele não é invicto na carreira. Rickson tenta esconder o motivo desse nome, com seu jeito tímido e envergonhado, querendo passar rapidamente pelo assunto, mas rindo, o irmão e o pai entregam-no. O pai conta que, desde os 10 anos de Rick, a diretora frequentemente chamava ele e sua esposa, Sandra, para conversar.
– A diretora dizia ‘Olha, as meninas brigaram por causa do seu filho’, e eu tinha que ir lá e assinar a ata.
E Ranieri aproveita a situação:
– Ah, o Rick é o rei da mulherada! A gente atenta ele com isso direto, e ele fica bravo!
Ser chamado de ‘The King’ é a razão de muitas brincadeiras e risadas entre os irmãos, que provocam Rickson em vários momentos com isso.
A pouca idade e suas polêmicas
Começar muito novo na carreira profissional tem suas adversidades. O preconceito, a falta de apoio na escola, constantemente escutando a frase ‘você é muito novo, não sabe o que quer da vida’. O atleta, Rickson Thai, já passou por vários aborrecimentos, mas sabe que quer ser lutador a vida inteira. Além da própria discriminação por sua pouca idade, ele teve algumas participações em eventos barradas por esse fator.
Em 2014, ‘The King’ foi convidado a lutar no Shooto Brasil – o maior evento de MMA do país. No entanto, após a polêmicas relativas à sua idade na época, apenas 15 anos, e a previsão de participação no evento, a organização adiou sua estreia para quando completasse 18 anos, seguindo, assim, o regulamento da competição.
– Isso não afetou em nada minha carreira. Pelo contrário, ficou melhor ainda, porque esse ano recebi o convite para lutar em um dos maiores eventos do Brasil!
O evento a que Rickson se refere é o Jungle Fight, criado em 2003 e considerado, hoje, um dos melhores eventos de MMA do Brasil e da América Latina. José Aldo, Fabrício Werdum e Rogério Minotouro são alguns atletas conhecidos, nesse esporte, que já participaram e foram projetados pelo evento. Neste ano de 2015, o convite foi feito a Rickson, mas novamente, por sua idade, não pode assinar o contrato de participação.
No Brasil não há órgão que regulamente a prática de MMA, portanto não são todas as competições que liberam a participação de menores de 18 anos no profissional. Cada evento é filiado à uma entidade ou confederação, e deve seguir as regras impostas por ela.
A Comissão Atlética Brasileira de MMA regulamenta o UFC aqui no Brasil, e segue, no país, a Lei Nº 9615 de 24 de março de 1998, ou a Lei Pelé, como é conhecida. Ela reconhece a total profissionalização do atleta somente a partir dos 18 anos.
Em algumas lutas internacionais, se emancipados pelo pai, Rickson e Ranieri – que já é emancipado – podem participar. Em 2014, quando ele tinha só 15 anos, teve oportunidade de lutar no UFC, mas não pode pela idade. A organização do evento só fecha contrato com lutadores maiores de 18 anos. Enquanto a maioridade não é atingida, ele segue treinando, se aperfeiçoando em outras competições e com clareza do seu sonho:
– Minha vida é lutar e essa é a carreira que quero seguir!
A próxima luta de Rick acontece neste sábado, dia 21, no ‘Three Frontier Challenge’ (Desafío tres fronteras), na Cidade do Leste (Paraguai). Ele luta com o paraguaio Ale Chavez e busca seu segundo cinturão internacional.
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Excelente reportagem. Parabéns a esse nosso campeão que nos enche de alegria. Ser campeão do mundo é o que lhe espera. Uma imensa trajetória de vida, onde a humildade o torna mais campeão ainda. Muita saúde e sucesso a essa família unida e feliz.